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Segundo e último dia de competição: muitas estrelas no mar

Por Richard Pedcini

Poucas ondas e Ulisses bicampeão

A previsão para o segundo dia do Tambaba Open de Surf Naturista era das piores. No primeiro dia somente tinham aparecido quatro competidores para a Categoria Local, apesar de previsões oficias e extraoficiais de que haveria dez. A promessa de que as 16 vagas disponíveis estavam quase fechadas não persuadia. 

 

E sábado de madrugada, o céu abriu. E domingo amanheceu chovendo. 

 

Porém, os maus agouros não foram realizados, mas nem os bons. Às 9:00 da manhã o céu já estava um azul celestial. O anunciador Wagner achava que “as ondas eram melhores duas horas atrás, mas depois da virada da maré devem melhorar de novo.” Não melhoraram.
 
Uns competidores não compareceram, como Willians que era inscrito pra a categoria Open e qualificado pelo Expression Session com sua 3ª colocação no sábado. Mas apareceram outros.

Os rostos da categoria Local eram todos conhecidos. Na categoria Open, dois novatos ilustram como o Open pode se abrir a novos competidores. Anderson Fidelis da Silva é índio Potiguar da Paraíba, trazido pelo seu amigo Hugo Santos da mesma tribo e aldeia, que por sua vez está no Open de Tambaba pela terceira vez, trazido pelo William Meira, das pranchas WM. Outro é Kauan, filho do competidor histórico Jota Filho. Domingo foi não somente sua primeira vez no Open, mas sua primeira experiência com uma praia naturista. 

Reginaldo Filho fez falta, mas a maior ausência foram as ondas. No Expression Session, que premia pela melhor manobra, oito competidores foram para o mar, e juntos 

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conseguiram somente duas ondas que valiam para a pontuação. Nas baterias preliminares o mar não estava muito melhor. 

 

Entre os competidores, Hellington “Rato” Ferreira se destacava pelo jeito descolado. Sábado, foi preciso buscar ele na Arca do Bilú para a única bateria da categoria Local, que venceu, levando a prancha. Dos surfistas nus, ele era mais nu que os outros, pois desprezava uso do leash que prende a prancha ao surfista. Ele abandonou o Expression Session, insatisfeito com as ondas. Enquanto pranchas de surf exibem pinturas variadas e fortes – como o fundo preto com estrelas brancas de Anderson Ferreira – a de Hellington se destacava das demais. Seu desenho Op Art em verde que sugeria que veio direto dos anos setenta portando seu dono. Mas no pódio, Rato mostrou um entusiasmo desenfreado, fazendo questão de levantar seu troféu da Local junto com o da Open. 

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Ulisses Meira mostrou a competência que o levou ao circuito profissional, e a confiança que isso lhe deu. Na bateria final, enquanto os outros três competidores procuravam ondas no lado direito (o norte da praia, “esquerda” e “direito” são da perspectiva do surfista) Ulisses foi para a esquerda, e conseguiu as ondas e o bicampeonato – pois também venceu em 2023. Sua experiência é visível na areia também, na sua consciência da presença da câmera. Depois do campeonato, conversou com pessoas do Rio de Janeiro sobre a possibilidade de um campeonato na Praia de Abricó. 


O 15º Open incluiu um tributo especial ao Marcus Bilú, falecido em abril, foi idealizador e

organizador do surf naturista em Tambaba, e também a presença de uma equipe de Rede B TV, de João pessoa, emissora que existe no Yopu Tube. Enquanto é comum que a TV fique o tempo suficiente para conseguir um clip de dois minutos, a Rede B TV ficou durante o evento inteiro, com duas câmeras, e depois foi vista na Arca do Bilú filmando uma entrevista com Dan, o filho do Bilú, que segurava o neto do finado nos braços. Talvez estas ondas da TV apoiaria o Open de Tambaba melhor que as ondas do mar. 

 

O resultado do Open foi Ulisses Meira em primeiro lugar, Hellington “Rato” Ferreira em segundo, William Meira em terceiro, e Jota Filho em quarto. William Meira conquistou o Expression Session.  

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Novos e antigos
Os competidores incluem caras antigas e novas. Entre os antigos, os três irmãos Meira prestigiaram o 15º Tambaba Open, como em 2023. Às 11:00, Ulisses já estava treinando, pegando as ondas no lado norte da praia, e Wagner estava aguardando administrar uma aula de surf nu para principiantes, antes de entrar no mar. 

 

William Meira, shaper das sonhadas pranchas de premiação, estava sentado entre dois concorrentes novatos e indígenas, da aldeia Alta da Tambar, na Bahia de Traição no litoral norte do estado. João Anderson Fidelis da Silva, de 32 anos, de feições indígenas e óculos espelhados, disse que já participou de outros campeonatos, inclusive o paraibano, mas é sua primeira vez no Open de Tambaba, “é a minha primeira vez surfando nu.” 

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Ele veio a convite do seu amigo de aldeia, Hugo Santos, de 31 anos, outro Potiguar da Paraíba, que já participou três vezes no Open de Tambaba. Veio na primeira vez “chamado pela família Meira, William.” Já participou de outros campeonatos como o Paraibana e o Nordestino Amador. Disse que “Já surfei no Rio de Janeiro, Ceará, Rio Grande do Norte, Fernando de Noronha, e Ilhéus, mas nu, só aqui na Paraíba.”

 

Daniel Grijo do Espirito Santo, está no Campeonato de Tambaba pela segunda vez. “Estou treinando mais, mas não nu” ele disse. Seu primeiro Tambaba Open era a segunda competição de surf que ele entrava. O motivo de vir para o Tambaba Open é simples, “é uma competição que não tem custo.” Ele afirma que “Já surfei pelado uma vez, em um praia que é oficial de nudismo, no Espirito Santo.” Engenheiro químico, suas teses de mestrado e de doutorado eram sobre cannabis, “obtenção de extrato de alta qualidade, inclusive para uso medicinal e alívio da dor.” A especialização é refletido em uma folha de cannabis sobre um mapa do Brasil desenhado na sua prancha de 5’10’, marca TIJ Industries, de um amigo do Espirito Santo. A prancha veio na garupa quando se mudou para João Pessoa ano passado: “Três mil quilômetros de moto, de Paraná.”

Pai e filho competem

Kauan, filho de Jota Filho, participou da primeira bateria do Open e se classificou para as semifinais, perguntado se vai enfrentar o pai na semifinal, riu. Ele já participou de vários campeonatos, seu melhor resultado sendo primeiro lugar no sub-12 na Barra da Gramame. Ele atribui sua proeza no surf ao “ensino e sangue do pai.” Ele fez 18 anos em maio, e esta não é somente sua primeira Tambaba Open, mas sua primeira vez numa praia naturista. “Foi estranho no começo, mas com um pouco tempo fica bem natural." Ele veio ao convite do pai, e “De primeira, eu hesitava, mas aí pensei, tudo mundo vai tá lá do mesmo jeito, dai, eu vou.”

Enquanto sua namorada já torceu para ele em vários campeonatos, ela “não é de naturismo.” Vai voltar a Tambaba? “Volto, sim.” 

 

Jota Filho tem mais de dez anos do Open de Tambaba, e já chegou a liderar o ranking paraibano de surf. Este não é o primeiro campeonato em que ele concorreu com o filho Kauan, perguntado sobre o resultado dos outros embates, ele disse com um sorriso, “O pai ganhou.”


Domingo foi o primeiro dia de Kauan em praia naturista, mas o pai afirma, “Não foi difícil persuadi-lo” a vir. Jota Filho sugere como conseguir trazer mais participares ao Open, como ele

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trouxe o próprio filho.  “Não adianta só participar. Tem que se envolver, tem que chegar junto às pessoas.” Ele tem outros filhos surfistas? “Tenho mais um filho, de quatro anos. Este não surfa … ainda.”

 

O filho competiu na primeira bateria, o pai na segunda, os dois se qualificando para as semifinais, onde se enfrentaram. Numa certa hora pai e filho estava surfando em pontos opostos da área, um seguindo uma onda para o norte, enquanto o outro seguiu para o sul. O resultado foi, de novo. positivo para o pai, que acabou ficando na 4º posição no campeonato.

 

Uma foto dos dois tirada depois da premiação mostra que o filho já é mais alto que o pai, e com 18 anos, Kauan tem tempo para crescer. E aprender. 

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Surf e naturismo, ou surf vs naturismo?

O Tambaba Open de Surf Naturista sempre experimenta uma tensão entre o “surf” e o “naturista”. Foi visível domingo quando a bateria final da categoria Open, o ponto mais alto do torneio, coincidiu com o corte de bolo do 28º aniversário da Sonata. Entre os presentes na tenda, a fila do bolo era prioridade absoluta sobre o evento esportivo acontecendo no mar. Mas justiça seja feita: quando fatias do bolo foram finalmente entregues aos árbitros, eles declararam o bolo “primeiro de luxo”.

 

Novos espectadores, também

As paredes da tenda eram cobertas de bandeiras de associações naturistas do país inteiro, e a tenda cheia deles. Hamilton Tabosa veio de Fortaleza com ANACE especificamente para o torneio, que ele assiste pela primeira vez, ainda que não seja sua primeira vez na praia. Seu filho Eddie é estreante, com 30 anos se disse “naturista desde este ano.”

 

Um que veio assistir domingo é Gabriel, de 33 anos, gaúcho de Canoas mas que mora quatro anos em João Pessoa. Ele estava surfando de body board na Praia de Arapuca quando os surfistas o informaram do campeonato acontecendo ao lado, e ele veio conferir. Não é a primeira vez que vem a Tambaba, “Mas agora, vou vir mais.” Ele notou que as ondas na Arapuca estavam melhores do que em Tambaba. 

 

A questão de mulheres no Open – respondido por uma mulher

No estacionamento da Arca do Bilú depois do campeonato uma jovem estava segurando a

prancha da surf no rack do teto do carro. Perguntada porque ela não participava do campeonato de Tambaba, ela respondeu, “Sou amiga de todos os surfistas da praia, mas se eu participar do surf nu, eu nunca mais vou conseguir um namorado na Paraíba. O homem aqui é muito machista, não aceita.”

 

Ela disse que até umas fotos “sensuais, não nuas” que ela tirou na praia repercutiu na família. “Alguém chega para meu pai na praça e comenta das fotos, e estou acusada de tirar sua moral.”

 

Comentou uns outros preconceitos da região, “Fui para praia hoje com minha amiga (ao lado do carro) e um amigo meu da praia comentou, ‘Arti, se eu não soubesse que você é hetero, eu te acharia lésbica.’ Homem vê duas mulheres já um pouco mais adultas, e acham que há um motivo para que não estejam com um homem.”

 

E porque ela não está com um homem? “No bairro onde moro, eu saio toda manhã para passear com o cachorro [que estava no banco de trás] na calçada ao lado do mar. As vezes de uma distância, eu vejo um rapaz que poderia ser interessante. Mas quando chego perto, ele está segurando uma câmera [ela mostra com a mão estendida para cima] tirando fotos de si mesmo. Eu passo e ele nem me nota, continua com o braço estendido. Eu acho que estas pessoas moram num mundo diferente do meu.”

 

A questão de incluir mulheres no Open de Tambaba seria além da capacidade do equipe organizador. Mudar o Open não seria suficiente, seria preciso mudar o paraibano.

(enviado em 10/09/24)

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